Equipe campeã mundial foi expulsa da Fórmula 1 após FIA encontrar irregularidades
Há 40 anos, a Tyrrell era a última resistência aos motores turbos. Fiel aos seus motores Cosworth, a equipe enfrentava a temporada de 1984 com uma desvantagem de 220 cavalos em relação à concorrência. No entanto, o veterano “Tio Ken” tinha seus truques e apostava em uma dupla promissora de pilotos estreantes, confiando no talento deles.
Apesar das suspeitas que surgiam, e após um pódio no Grande Prêmio de Detroit, o pelotão descobriu que o que parecia um milagre era, na verdade, uma trapaça. No fim, a equipe foi excluída do campeonato, não apenas por esse episódio, mas por uma série de decisões anteriores que, quando analisadas com mais cuidado, revelaram uma espécie de vingança.
O teimoso dono da equipe
Ken Tyrrell, nascido em 3 de maio de 1924, em East Horsley, no Surrey, Inglaterra, começou sua carreira como comerciante de madeira e piloto amador antes de se envolver na organização de equipes de corrida, especialmente a partir de 1960.
Quatro anos depois, ofereceu um teste ao jovem escocês Jackie Stewart, identificando seu talento e levando-o à Fórmula 1. Em parceria com a Matra, Tyrrell fundou sua equipe, que conquistou o primeiro título mundial em 1969, com Stewart, que ganharia mais dois campeonatos até sua aposentadoria, em 1973.
Nos anos seguintes, o desempenho da equipe começou a declinar, apesar de projetos ousados como o P34, o carro de seis rodas, e a presença de pilotos como Jody Scheckter, Patrick Depailler, Didier Pironi e Michele Alboreto.
No fim de 1983, a Tyrrell havia vencido apenas três corridas nas últimas cinco temporadas. Fiel aos motores Cosworth, suas performances eram superadas pelos carros mais potentes da Renault, Ferrari, Brabham, McLaren, Williams, Lotus e até mesmo da Toleman. Na temporada de 1984, a Tyrrell foi a única equipe a usar motores aspirados, que apresentavam um déficit de até 220 cavalos.
Mesmo com essa desvantagem, Tyrrell estava determinado. Para a temporada de 1984, recrutou duas promessas: o britânico Martin Brundle, vice-campeão da temporada anterior, e o alemão Stefan Bellof, apoiado pela Porsche.
Embora os motores Cosworth fossem mais fracos, sua resistência, consumo reduzido e maior manobrabilidade em circuitos urbanos poderiam ser vantajosos. E havia três pistas que favoreciam esse tipo de carro: Monte Carlo, Detroit e Dallas.
Além disso, Tyrrell se opunha aos turbos, acreditando que eram ilegais. Protestou contra a Lotus em 1971, quando usaram o carro turbina, e também contra o Brabham 46B de Gordon Murray em 1972, que usava um sistema de ventilação. Na sua visão, os turbos da Renault, introduzidos em 1977, nunca deveriam ter sido permitidos.
Apesar da oposição aos turbos, Tyrrell se arriscou na temporada de 1984, com resultados surpreendentes. Em Jacarepaguá, Brundle terminou em quinto, após o carro de Patrick Tambay, da Renault, ficar sem combustível na última volta. Bellof conseguiu um sexto lugar em Zolder e mais dois pontos em Imola, sempre aproveitando os erros de outros pilotos que ficavam sem combustível.
O primeiro circuito urbano da temporada foi Monte Carlo, onde a previsão de chuva tornou as condições ainda mais desafiadoras. Após um acidente de Brundle, que não conseguiu se qualificar, Bellof, partindo da última posição, surpreendeu a todos com seu ritmo rápido. Muitos acreditam que ele estava mais rápido que Ayrton Senna, no Toleman. Bellof terminou em terceiro, ganhando mais dois pontos.
Esquema descoberto e castigo exemplar
Duas corridas depois, a F1 chegou a Detroit, outro circuito urbano. As performances foram aceitáveis, com Brundle conquistando o 11º tempo e Bellof o 16º. Durante a corrida, Brundle teve um desempenho impressionante, alcançando o segundo lugar e quase ultrapassando Nelson Piquet, líder da prova.
No entanto, após a corrida, outras equipes começaram a suspeitar e pediram que o carro fosse pesado. Foi aí que o esquema de manipulação foi descoberto. A Tyrrell usava água nos carros para, supostamente, “arrefecer os freios”, mas na verdade, o peso estava sendo ajustado para manipular o desempenho.
Esse truque remonta ao GP do Brasil de 1982, quando a Brabham e a Williams usaram lastros de água e chumbo para ajustar o peso de seus carros. A Tyrrell, que não aderiu ao boicote da FISA ao GP de San Marino, foi a única equipe a correr, com Michele Alboreto conquistando um pódio. No final de 1983, quando a FISA impôs um limite de 220 litros de combustível, a Tyrrell foi a única equipe a votar contra a regra, tornando-se alvo de críticas.
A FISA impôs uma pena severa à Tyrrell, excluindo-a do campeonato após o GP da Grã-Bretanha, mas a equipe recorreu e continuou competindo em algumas corridas. Brundle sofreu um grave acidente em Dallas e foi substituído por Stefan Johansson, enquanto Bellof focava no Mundial de Endurance, que conquistou. Em seguida, a Tyrrell perdeu seu recurso e foi banida do restante da temporada de 1984.
Em 1985, “Tio Ken” finalmente cedeu às evidências e adotou os turbos, escolhendo a Renault. No entanto, a primeira temporada completa com motores turbo foi em 1986. Ironia do destino, quando a FISA decidiu banir os turbos a partir de 1988, a Tyrrell foi a primeira a abandonar a tecnologia e voltou aos motores Cosworth em 1987. Tyrrell nunca foi fã dos turbos e, assim que teve a chance, se desfez deles.